Em meados de 90 do seculo vinte, a colega Ana Maria Primavesi vei a Santa Catarina para conversar com os agricultores do vale do Itapocú num evento promovido pela Epagri de Guaramirim. Convidada pelos engenheiros agrônomos que coordenavam o evento, foi lhe dado a palavra e começou a falar sobre o solo com os agricultores presentes, a maioria rizicultores.
Com 75 anos, Primavesi falou da sua paixão: o solo vivo.
Emotiva, simples, falando o linguajar dos colonos e dos rizicultores cativou a plateia. Conversava mansa e pousadamente sobre o solo sem tóxicos, sem agrotóxicos e sem adubos químicos. Sou amiga do solo natural e falou que a ecologia do solo faz as plantas se desenvolverem muito bem, melhor do que em terras envenenadas.
Foi falando dessa agricultura orgânica tropical, quando intempestivamente a sua fala foi interrompida por um colega eng. agrônomo do serviço de assistencia tecnica do Estado, que exaltado a desacatou. Esbravejando aos critos a rotulou de mentirosa, de uma agitadora que nada do que estava falando eram tecnicas recomendadas pela Secretaria da Agricultura do Estado de SC. Os organizadores dando apoio ao exaltado colega pediram para que ela se retirasse do recinto pois ela não estava bem da cabeça e que estava fora da realidade.
Sem nada falar, acompanhei a colega Primavesi para fora do salão de bailes em Guramirim. Como idosa, pediu para descançar num gramado proximo usando as sombras das arvores.
Aos poucos começaram a chegar os agricultores que pediram desculpas pelo ocorrido e que gostariam que ela continuasse. Sem local apropriado, todos sentados a volta da agricultora organica e tambem engª agronoma mais de 60 familias de agricultores a escutaram num silencio e prestando muita atenção.
Parecia um milagre que tinha acontecido. A algazarra do salão, se transformou num verdadeiro culto a natureza e à vida. Assim foram horas conversando mansamente com os agricultores, falando como os agricultores gostam e sabem compreender quando outro agricultor fala sobre os metodos naturais que aplica no sistema que favorece a vida.
Para mim, que estava do lado de Ana Maria Primavesi, editando um livro intitulado MENOS VENENDO NO PRATO, que seguia a mesma doutrina de ensimamentos, experiencias semelhantes de constrangimentos e assédio tecnico, tambem foram desferidas contra mim.
Tranquilizei a colega Ana Maria Primavesi que não deveria ficar irritada com o comportamento dos colegas, que jamais tiveram a oportunidade na vida pratica com os pais, nas faculdades de agronomia e posteriormente atuando no serviço publico, de se relacionar com solos vivos, com técnicas que não utilizavam os agrotóxicos e adubos químicos. Mostrei a Ana Maria que o sistema capitalista de atrelamento aos produtos das multinacionais, havia formatado a cabeça desses moços engenheiros agrônomos. Muitos dos presentes eram fanáticos receitadores de agroquímicos, pois os baixos salários pagos pela Secretaria da Agricultura e EPAGRI, obrigavam muitos a se dedicar nas "horas de folga" na venda de produtos venenosos auferindo na maioria das vezes mais comissões que o próprio salario do serviço publico.
O sistema de Ana Maria Primavesi estava colocando em risco o bom negocio dos venenos que muitos estavam praticando.
Em 1985 quando participei do Congresso Nacional de Agronomia em Florianópolis, apresentei um trabalho de pesquisa que havia realizado no município de Massaranduba, o maior produtor de arroz de SC. A pesquisa tinha sido facilitada pela comunidade luterana que chamou mais de 100 famílias para receber treinamentos para responderem o questionário que havia sido preparado para a pesquisa.
Depois de computados os resultados, chegaram-se a grosso modo informações estarrecedoras, que jamais haviam sido divulgadas para a sociedade, para os agricultores e para os consumidores. Elevados índices de intoxicação, mortes, aposentadorias precoces, elevadíssimas doses receitadas, totalmente foram das recomendações dos fabricantes, a cooperativa foi envolvida na cumplicidade do bom negocio que acontecia e depois de apresentado o trabalho no congresso, os jornais estaduais no dia seguinte deram o alarde bombástico e irresponsável deixando alguns setores muito apreensivos.
A retaliação que sofri e que o pastor luterano também sofreu, foi constrangedora. Eu fui na mesma semana condenado pela câmara de vereadores de Massaranduba onde havia um vereador da empresa DIPPIL fabricante de agrotóxicos para conservação da madeira, que propôs moção para me execrar com o titulo de CIDADÃO INIMIGO DE MASSARANDUBA. A votação foi por maioria absoluta.
Tamanho era a desinformação oferecida para os agricultores, consumidores e o meio ambiente.
O sistema perverso imposto pelas empresas dos agrotóxicos, havia blindado toda a transparencia que eu conseguira furar com a pesquisa, que um ano depois foi inserida em um livro de autoria de José Lutzemberger e Michael Schwartzkopf intitulado Giftige Ernte - Safras venenosas - 1988 Eggenkmp Verlag recomendado pela ONG alemã BUND - Bund für Umwelt und Naturschutz Deutschland e pela PAN - Pestzid Aktion Netzwerk da qual a APREMA-SC era coordenadora para o Brasil-PAN-BR.
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